março 18, 2006

"Pienso en sus caricias, pienso en sus miradas..l'amor que antes tu me dabas.."

"Sí, tu me gustas.."
Hoje sinto-me muito Cubana.
Não paramos de recordar aquelas duas semanas passadas a 9000 kilómetros daqui, com o seu clima tropical, as toneladas de frango às refeições e as águas transparentes que teimam em perseguir a nossa imaginação, quando queremos pensar em algo para além do banal. Num dia de chuva como este, com uma aura deveras cinzenta, não consegui deixar de ir à janela e contemplar o mar, sendo visível a diferença entre este oceano e aquele que rodeava Cuba. O verde esmeralda, o azul transparente dão lugar a um cinzento agitado, num dia de Inverno que nunca parou. Ao ver a paisagem, coloco perto do Cabo Espichel dezenas de palmeiras, uma mancha verde destaca-se no fundo do rio Tejo e vejo a areia fina, os desenhos nela, a brasa do sol que estala a pele e as longas espreguiçadeiras, as anfitriãs do turista-leigo na praia. Acordo e só vejo pequenas estradas de chuva, desenhadas diante mim, na janela da minha varanda. Um nevoeiro, um borrão no céu, um mar revoltado, lembrando as imagens dos filmes noir, onde um detective surge do nada para buscar a mulher depressivo-suicida que se quer atirar da falésia - tal como a miúda que se atirou de uma, por causa do Casting dos "Morangos com Açúcar" -.
Fiz as minhas lides domésticas e antes do almoço pus música cubana a circular pela sala. E lá voltaram as imagens que insistem em povoar as minhas pupilas. Sol, calor, a humidade, a sujidade das ruas de Havana que se estrenha na nossa pele, o cheiro a sensualidade, a sexo, a vida. Lá veio a conversa de Cuba, como se não houvesse mais destinos no mundo igualmente, ou até mais, interessantes. Como se aquela terra fosse o nosso cantinho especial, a nossa casa de campo, o nosso refúgio, o local onde todos os problemas têm uma profunda alergia. É como eu costumo dizer: "Há coisas que nos marcam para sempre e nunca mudam." Cuba não muda e as pessoas que lá conheci também não. Não as esqueço. Há alguém fundamental e é dessa pessoa que me apetece falar agora..Sim, porque aqui falo de tudo o que me vem à cabeça, é verdade.
A. Era alto, tinha cerca de 1,85. Secalhar um pouco mais. Tinha sobrancelhas fortes e bem desenhadas, um nariz fino e comprido, dois olhos de um azul intenso, profundo, fortes como o fundo do mar e um sorriso aberto e descontraído, como se não houvesse amanhã. Pestanas longas, escuras, belas. O cabelo era meio ondulado e fino, bem tratado, sedoso como cabelo de mulher, sendo as suas pontas rentes ao lóbulo da orelha, com um leve degradé. Era bastante magro, de casual style, com os seus óculos de lentes castanhas à anos 80, os calções pelo joelho largos e uma sempre t-shirt onde se desenhavam as delícias da sua simplicidade. Lembro-me dele antes de o conhecer, estava no mesmo hotel que eu em Havana e reparei nele quando estava a tomar o pequeno-almoço no hotel. Reparei no cabelo e nos dedos, compridos, tal como sempre gostei de ver num homem. Mãos bonitas, com as veias finamente delineadas e de uma elegância consternadora. Quando percebi que iríamos fazer parte do mesmo grupo do circuito para o lado oriental de Cuba, pensei que poderia ser uma oportunidade para conhecer alguém. Não nos largamos a partir desse dia. Olhares, muitas conversas de "mojito", e cumplicidade trocadas.
A minha mente estava em Cuba, definitivamente, - ou então em Espanha.. - e nunca em Portugal. Não senti saudades ou uma réstia de vontade de regressar para cá, com uma ou duas excepções..compreensíveis. Com as conversas de horas em "portunhol" com o A. cada vez me distanciava mais da minha tão chamada pátria e sentia-me uma aventureira, à procura de novos conhecimentos, em terras que mal conhecia. O que nos unia era talvez isso, o empreendorismo em nos conhecer mutuamente, de viver aquela experiência que daí a uns dias tomaria o seu fim, regressando à rotina que tanto desdenhávamos. A família do A. era muito simpática, sempre sorridentes, sempre bem dispostos. Fiquei feliz quando soube que íamos ficar no mesmo hotel em Varadero. Felizmente, não fui a única a pensar assim, também ele ficou contente.
E já descansados no calor temperamental da praia - sim, porque segundo sim, segundo não, era com cada carga..-, conversámos sob o olhar da lua, junto à piscina, ou no bar, de copo à frente, falámos das nossas experiências das relações humanas, com uma confiança inabalável, de uma aparência consternadora, de anos e anos de existência. Na realidade, só nos conhecíamos há uns dias. Éramos dois românticos desconhecidos. E daí, os desconhecidos se contemplam sobre a sombra da atmosfera afrodisíaca e se aproximam, tornam-se namorados secretos, em sintonias que são só suas e só eles as conseguem sentir, naquelas águas mornas que lhes aquecia os corações e ligavam os seus olhos, através desse fio invisível, um brilhante estímulo para os seus púlpitos únicos.
Horas na piscina, um passeio de cinco minutos - devido aos mosquitos que nos queriam comer vivos -, gargalhadas e dobragens de filmes. Nunca me vou esquecer de ti. "Larita..Larita", dizia-me ele enquanto estava prestes a adormecer ao seu lado. "Te voy lebar como uma reina". Doce A. Na véspera da sua partida para Espanha, vi que realmente era um amor de verão, mas um amor de verão que ele não queria esquecer, nem apagar, porque segundo ele, dói. E dói. Muito.

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