abril 09, 2007

!26! (III)

"Um Baileys..de menta..pode ser."
00:30. Deixámos o "vega power" para trás e arrastámo-nos por essas ruas da cidade das sete colinas. Destino: Bairro Alto. O T. ficou contente com a minha prenda e eu, ainda mais, por ter contribuído para a sua satisfação naquele momento. Estava um frio de fazer rachar as pedras da calçada e o meu nariz, que já tinha voltado ao seu estado normal, antes de eu ter ido jantar. Completamente e totalmente dormente. Talvez por esse motivo apenas me recordo de seguir as pernas. Aliás, as pernas seguiam o grupo que, de forma mais ou menos harmoniosa, se iam juntando aos pares, por aquelas ruelas abaixo. Mas o frio era tanto, que quase chorava e limitava-me a seguir o rebanho.
Paragens, arranques, paragens. Alguém parava porque a amiga aparecia (lembro-me dessa situação com a A.) e o grupo parava. "E vamos lá malta..". Yo, espera lá mais um pouco que afinal não é desta." Pára, arranca. É quase igual ao trânsito na hora de ponta em Lisboa, acessos e arredores. Finalmente poisámos num barzito no pleno coração do bairro.
"Páginas tantas". Entrámos. Todo o universo do Jazz decorava o espaço ligeiramente sombrio e misterioso. As cores dominantes, ao invés do que se tinha verificado no "Terra", eram tendencialmente mais escuras, apesar de haver mais contrastes, mais extravagância. A neblina dava a entender a quantidade de jovens fumadores que lá se encontravam, desejosos de socializar pacificamente, entre um copo de puro álcool e uma gargalhada semi embriagada. A música Jazz inundava os nossos ouvidos e contagiava os membros corporais. Por pouco tempo, claro.
Sentámo-nos de roda de um poço que, curiosamente e eu não fazia a mínima ideia, é património arqueológico. Não tirei as dúvidas, mas penso que seja da época romana. Seja como fôr é um poço antigo que está conservado (nem por isso) e tapado, dento do bar. Como não havia mesa, juntamos cadeiras ali perto. O grupinho aumentou. Apareceram umas moças de nenhures que iniciaram uma linha de conversação ininterrupta com o D. e namorada. Eu por ali estava, a observar e a mandar postas de pescada. Se me apetecesse, claro.
"O que vão beber?". Ela era gordinha, aloirada e estava vestida de um vermelho vivo que a fazia distinguir das restantes silhuetas nocturnas do bar. Aparentava ser simpática. "Para mim..pode ser também um baileys..de menta sim", pedi. Só que na volta a rapariga descontrolou-se. Ia entregar uma garrafa de água que uma moça do grupo tinha pedido, moça essa que lhe fez sinal do género de insinuação "ó filha, a água é para aqui", mas a empregada de nariz empertigado não viu nada e deixou a garrafa ali em cima do poço. Ai, ai. Estragar o património é que não, sua besta..
O tempo passou, as conversas seguiram a sua devida orientação (que eu não vou revelar aqui, era o que faltava falar na conversa que tive sobre jornalismo com o B. e que a irmã da namorada do D. estuda em Coimbra..bah). E o tempo não voltou atrás. Hora de bazar. Segui com o T. e a A. para fora dali. Tínhamos que apanhar os transportes e eram os últimos da noite. Eu tinha a ligeira suspeita que não tinha comboio, coisa nenhuma, mas não consegui confirmar através da linha da CP. No meio da multidão borracha, lá nos íamos empurrando, tentando não perder o próximo de vista. Na realidade, dezenas de jovens espalhavam-se nas ruas, com copos de plástico, garrajas de vinho ou um cigarro queimado por entre os dedos. Os olhares concentravam-se à medida que galgávamos aquelas ruelas, em velocidade turbo - e se não era mais é porque, de facto, não era de todo possível -.
2:15. Faltava um quarto de hora para o comboio arrancar. Um grupo de amigos bêbados entovam cânticos e deidicavam-nos "qualquer cena um pouco fatela" à medida que furávamos as filas desordenadas. Na altura da bifurcação disse "e se não houver comboio?". "Ligas-me que eu te ajudo.", disse o T. Dito e feito. Ignorei os olhares salivados dos homens que por ali se quedavam e marchei para a estação..que já estava fechada. Bingo. Não havia mais comboios. Liguei para o T., que por correr em pressas para apanhar o último barco - esse sim existia, não era fruto da imaginação ou fantasia dele -, mal conseguia falar. Enviou-me os contactos dos amigos que tinham carro e que tinham estado connosco nessa noite e, após uns telefonemas junto à praça de táxis do Cais do Sodré, o problema estava resolvido. Bastava aguardar.
Frio, frio, frio. Grupos de jovens passavam. Dois bêbados sentaram-se nas escadas, ao meu lado a falar de ganzas e tal. Comecei a achar que ainda me iam vender produto e afastei-me mais um pouco. Andava de um lado para o outro, esperando não gelar mas tornava-se complicado, com tanto táxi confortável à minha frente, aguentar a espera, numa altura em que já deviam ser perto das 3 da manhã. Dois indivíduos aproximaram-me para tomar um táxi.
"Não quer vir connosco?", interrogou-me o fulano loiro de cabelo farfalhudo e escaracolado, depois de ir-se preparar para abrir a porta do fogareiro à minha frente. "Err..para onde vão?". "Lux, vamos para a noite agora", respondeu-me. Continuei na minha, mas aprochegaram-se e encheram-me de perguntas que não tive problemas em responder, pois não eram segredo de estado. Mantive a serenidade e disse para irem lá para a night, curtir o que quisessem, que eu queria era ir para casa. "Ah esse teu amigo que vai boleia deve ser uma brasa, não o conheces e já vais com ele? Mas tu acreditas em histórias da carochinha?", palavras que me enchiam os ouvidos. Blá, blá, blá. Atitude típica do homem para dissuadir uma mulher de ir com outro. Tudo para que ela possa ir, isso sim, com ele. "Ah miúda, és gira. Com esse cabelo cajú e essa carinha linda deves ter quem queres..". Comentários ridículos ou escusados à parte, só me senti melhor com a chegada do B., depois das tentativas de assédio e propostas irrecusáveis para travar conhecimentos no mundo do jornalismo. Quer dizer, eu recusei.
"Ah o meu amigo já chegou, já pode avaliar à vontade", disse para o loiro com ar de choné. Ei-lo. B., no seu Citröen C2, prestes a salvar-me das garras do inimigos, com vários kilos de parafusos a menos. Na viatura vermelha e redondia, lá estava ele com um ar apático, interrogativo e meio pálido, mesmo com a barba arruivada a dar alguma côr. Fixou-me à espera de um sinal e de compreender que diabo se passava, mas não foi preciso muito tempo para entender. "Dá-me o teu número, miúda.", insistiam os destrambalhados. Devia ser a hora do circo. Disse simpaticamente não e deixei aqueles senhores, com ar de homossexuais - não que eu tenha alguma coisa contra, óbvio que não, mas juro que pareciam - seguir a sua vida. O B. lá estava dentro do carro, com um ar meio que duvidoso. "Já tavas a levar com eles não foi? Percebi logo." Sacou de um cigarro e acendeu-o enquanto nos dirigíamos ao semáforo. Com a janela semi aberta e a música alta, lá fui contanto a peripécia. Na sua camisola de algodão alaranjada, sereno, de olho escuro e afável, o B. deixou escapar "Ya, há malucos para tudo".
A noite podia ainda ser uma criança, mas só se fossem para os outros. O B. tinha sede e queria estacionar o carro para ir buscar uma água. Não coloquei objecções e o rapaz com ar de "puto rebelde" de brinco discreto na orelha e cabelo com jeitos, lambido com gel, lá parou o carro.
"Pam, pam, pam!"..."Tu mentiste-me! Tu mentiste-me!!". Era o loiro a bater no vidro da minha janela. Atrás de nós estava um táxi..o táxi deles, dos malucos que aturei durante 10 minutos! O B. estava perplexo. "Mas que merda é esta?! Foda-se!". Arrancou a fundo, com vontade de desaparecer da vista daqueles maluquinhos, e parámos. Tudo para descomprimir da crazy race, uma autêntica perseguição que, sem dúvida, foi o ponto alto e baixo da noite. Alto em estupidez, baixo em utlidade. Mas sempre dá um bom episódio para descrever. L.

2 comentários:

Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Anónimo disse...
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